postado por : UENES GOMES 25 de jan. de 2014

O Ofício da Fotografia em Minas Gerais no Século XIX
“Em casa de um photographo. Batem a porta e entram três caipiras: – Sumcê é que pinta gente? – Sim, por que? – Nós queremos ser pintado todos junto. – Ah! Já sei, querem em grupo. – É isso mesmo em quadrupede”. A engraçada passagem reflete a visão simplória de muitos mineiros do século 19, para o uso da “photographia”. O chiste foi publicado na edição de 19 de junho de 1881 de “O Leopoldinense”, jornal de cidade na região da Zona da Mata mineira, e está reproduzido no recém-lançado “O Ofício da Fotografia em Minas Gerais no Século XIX (1845-1900)”, do historiador Rogério Arruda.
 
Tente imaginar: no século 19 não existia câmera em todos os bolsos como hoje, muito menos, o “selfie” em rede social de um descontraído presidente norte-americano num funeral. Naquela época, para tirar um simples retrato era preciso planejamento e atenção às raras oportunidades. As câmeras eram levadas em lombo de mulas e a chegada dos “retratistas” em alguns locais era tão aguardada quanto a de um artista.
 
Em Minas Gerais, eram comuns “reclames” em jornais com a “itinerância” desses poucos representantes da “photographia”. As fotos de políticos ou de homens do povo tinham que ser encomendadas. E é por meio dessas pegadas publicitárias na nascente mídia da época que o historiador Rogério Ferreira de Arruda resgata um curioso lado da história das imagens.
 
Estudioso da fotografia em Minas desde a graduação na UFMG, Arruda verificou neste período uma lacuna sobre a história da fotografia no estado e desdobrou mais uma pesquisa depois de um doutorado. 
 
Pé na estrada
 
O historiador pôs mãos à obra e pé na estrada, assim como fizeram os retratistas que estudou. No levantamento foram recolhidos indícios em várias cidades mineiras, na época, importantes polos comerciais e sociais.
 
“Essa itinerância era uma característica não somente de Minas, mas da fotografia mundial”, reflete Arruda. O historiador explica que os fotógrafos, para garantir mais trabalhos, tinham que viajar. E nessas viagens, expandiram a fotografia pelo mundo.
 
Histórias e a gramática da época vivas nos anúncios
 
Um dos aspectos mais curiosos do livro “O Ofício da Fotografia em Minas Gerais no Século XIX (1845- 1900)” é o levantamento de imagens de anúncios de pelo menos 130 fotógrafos que atuaram no período. Os textos trazem uma gramática bem peculiar e um traquejo publicitário pomposo para atrair o cliente que queria “retratar-se”.
 
Em Lavras, o retratista Alberto Landoes declarava ao público da cidade que, “tendo aberto seu gabinete de trabalhos, acha-se a desposição das pessoas que queiram retratar-se”. Ali, o fotógrafo prometia imagens a “preços rasoaveis”. Já em Ubá, a “Photographia Popular” de Henrique Barandier avisa que “attende à chamados para fóra”.
 
Mas em Campanha é onde havia novidade. Na cidade, o fotógrafo Maximo Riberi “collocado sempre na vanguarda dos novos progressos” da sua arte, dispunha de novo processo fotográfico instantâneo “para retratos de crianças e de pessoas nervosas”, que não ficariam quietas nas demoradas técnicas de registros anteriores.
 
O livro traz a história destes fotógrafos e estúdios onde trabalhavam do século 19, em Minas. O quebra-cabeça dessas biografias foi montado por meio dos tais “reclames”. E foram muitas peças encontradas. Desde os pontos da itinerância que estes artistas faziam pelos rincões mineiros, até a técnica que usavam para fotografar. Novas sociedades para o trabalho, outros fotógrafos que herdavam os empreendimentos e demais ocorrências também puderam ser levantadas.
 
 
capa do domingo - Anúncios antigos - ACERVO BUBLIOTECA MUNICIPAL MURILO MENDES-DIVULGAÇÃO
Diário da Tarde, Juiz de Fora (1894) e Almanak de Juiz de Fora (1892) (Fotos: Acervo Biblioteca Municipal Murilo Mendes/ Divulgação)
 
 
No final do livro, uma tabela com o nome do fotógrafo, o período em que trabalhou, o estabelecimento ou referência de lugar onde trabalhava (“Photographia das Bellas Artes”, em Juiz de Fora, ou o “Gabinete Dentário e Photographico”, de Ouro Preto), a cidade e o endereço (“Cidade de Minas”, como se chamava Belo Horizonte, ou até “Freguesia de Águas Virtuosas”, atual Lambari). 
 
Historiador teria descoberto primeira fotógrafa de Minas
 
No “clube do bolinha” dos retratistas homens, uma mulher também deu o ar da graça. Trata-se da “viúva Liebenau”, que pode ser a primeira fotógrafa de Minas Gerais. “Seu marido, Guilherme Liebenau, era alemão e foi um dos principais fotógrafos de seu tempo. Ele adoece e morre em 1884. Sua esposa é que ficará à frente do ateliê de fotografia do finado”, conta o autor do livro, Rogério Arruda.
Durante alguns meses, a viúva anunciou na imprensa que estava dando continuidade aos negócios do esposo falecido no ateliê chamado “Photographia Alemã”. Os textos, em mais um registro primoroso da publicação, diziam: “Os trabalhos da casa são ja vantajosamente conhecidos como bem acabados e a annunciante envidará sempre todos os esforços, afim de poder acompanhar os progressos d’arte”.
 
Em um primeiro momento, ela divulga o trabalho ao lado de um sobrinho. Depois, sozinha, em Ouro Preto. “Portanto, sendo fotógrafa ou não ela foi a única mulher proprietária de estabelecimento fotográfico encontrada em minha pesquisa”, ressalta.
 
A partir de agosto de 1885, não mais é possível saber do paradeiro da possível fotógrafa. “Apesar de não ser possível afirmar com absoluta certeza que ela foi a primeira em Minas, esta hipótese também não pode ser descartada”, considera Arruda.
 
“O Ofício da Fotografia em Minas Gerais no Século XIX (1845-1900)” tem prefácio da historiadora Maria Inez Turazzi e projeto gráfico do designer Bruno Soriano. O projeto virou livro após ser contemplado pelo 12º Prêmio Funarte Marc Ferrez de Fotografia, no ano passado. 
 
Atualmente, Rogério Arruda é professor de História na Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM). O livro tem distribuição gratuita nos lançamentos e para algumas instituições. Em BH, há exemplares na Biblioteca Pública Estadual Luiz de Bessa, no Arquivo Público Mineiro, no Instituto Cultural Amilcar Martins. 
 
Os próximos lançamentos acontecerão em São João del Rei, Ouro Preto e Juiz de Fora, com datas as serem confirmadas. Informações pelo e-mail r.p.arruda@uol.com.br
 
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